Sexo sem camisinha e o ‘ressurgimento’ da sífilis

O uso correto e regular da camisinha feminina e/ou masculina é a medida mais importante de prevenção da sífilis

Em todo o estado de Minas Gerais, profissionais da saúde estão preocupados com o avanço da sífilis, infecção sexualmente transmissível
Todo mundo sabe que sexo sem segurança pode trazer consequências graves, como doenças que levam à morte. Mesmo assim, muitas pessoas se arriscam. Prova disso é o “ressurgimento” em níveis preocupantes de uma doença que se espalhou lá atrás, com a proliferação dos prostíbulos, e que agora volta ao radar dos boletins médicos: a sífilis.

Dados da Secretaria de Estado da Saúde mostram aumento significativo de casos da doença nos últimos anos em Minas Gerais. Considerando apenas o mês de janeiro, em 2017 foram registrados 765 casos de sífilis adquirida, aquela transmitida de pessoa para pessoa, geralmente por meio de relações sexuais sem proteção. Esse número saltou para 1.106 em janeiro do ano seguinte e para 1.316 em janeiro de 2019.

Considerando os 12 meses, foram registrados 11.056 casos no estado em 2017, número que subiu para 14.842 em 2018, um aumento de quase 4 mil novas constatações. Em todo o Brasil, mais de 158 mil atendimentos foram realizados em 2018, um salto de 30% em relação ao ano anterior.

“É importante se prevenir para evitar as doenças/infecções sexualmente transmissíveis”, diz Délcio

De acordo com o médico itabirano Délcio Lima Caldeira Junior, clínico geral e especialista em alergia e imunologia, o problema não é a falta de informação. Todo mundo sabe que é preciso usar preservativo para evitar doenças e gravidez indesejada. Na opinião do imunologista, uma das possíveis causas de tantas notificações pode ser essa “corrente cultural” baseada em hits como o funk, que “sexualizam” além da conta.

O médico, que está no dia a dia nos ambulatórios, afirma que o sexo está acontecendo cada vez mais cedo. “Adolescentes tendo relações sexuais sem ter uma formação estrutural de corpo, de órgão genital. Hoje, a gente tem um embasamento cultural dentro de música, dentro de estilos culturais como o funk, em que se fala cada vez mais sobre fazer sexo e não sobre o que é o sexo, a sexologia”, comenta.

“É importante destacar que é preciso usar camisinha não só para prevenir filhos, mas para evitar as doenças/infecções sexualmente transmissíveis. E toda a rede do Sistema Único de Saúde (SUS) distribui preservativos gratuitamente, seja nas unidades do PSF, nas UPAs e unidades de pronto-socorro. Esses casos de sífilis, acho que não é por falta de conhecimento. É muito mais pela falta de encorajamento de fazer o sexo seguro”, afirma o médico.

Realidade em João Monlevade

Em João Monlevade, como em outras cidades de Minas e do Brasil, os casos de sífilis adquirida superaram os demais registros (sífilis congênita – passada de mãe para filho durante a gestação – e sífilis em gestantes). Conforme dados da Secretaria Municipal de Saúde monlevadense, foram 53 registros em 2017, 62 em 2018 e 66 até agosto de 2019. Ou seja, o ano ainda nem terminou e os casos de sífilis transmitida já superam os dois anos anteriores.

A reportagem tentou encontrar informações de Itabira, mas os dados estavam embaralhados. Na Gerência Regional de Saúde (GRS), a assessoria de comunicação informou que não há números locais, apenas em nível estadual. Já a Secretaria Municipal de Saúde, por meio da Assessoria de Comunicação da Prefeitura, informou que tem tabulado apenas os dados de sífilis congênita e em gestantes. Os números da doença adquirida – o foco reportagem – não estavam reunidos.

“O aumento da sífilis pode ser atribuído à ampliação do diagnóstico por meio da testagem rápida na atenção primária, mas também há ocorrência da redução do preservativo nas relações sexuais, que consiste na principal forma de prevenção da doença”, afirma a coordenadora de IST/Aids e Hepatites Virais da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais, Mayara Marques, em nota divulgada no site da secretaria.

Não se preveniu, e agora?

Délcio Lima ressalta que, caso a pessoa tenha relações sexuais sem proteção com alguém suspeito de estar infectado, é caso para urgência e emergência. “A primeira coisa: fez sexo sem camisinha, procure imediatamente um órgão público, como pronto-socorro ou PSF, para fazer os exames de diagnóstico. Existem também as profilaxias medicamentosas. O ideal é ministrar nas primeiras 12 horas, que pode evitar algumas doenças como a sífilis”, esclarece o médico.

O que é

A sífilis é uma infecção sexualmente transmissível (IST) curável, causada pela bactéria Treponema pallidum. Pode apresentar várias manifestações clínicas e diferentes estágios (sífilis primária, secundária, latente e terciária). A sífilis pode ser transmitida por relação sexual sem camisinha com uma pessoa infectada ou para a criança durante a gestação ou parto.
A infecção por sífilis pode colocar em risco não apenas a saúde do adulto, como também pode ser transmitida para o bebê durante a gestação. Em formas mais graves da doença, como no caso da sífilis terciária, sem o tratamento adequado, a pessoa pode morrer.

Como prevenir

O uso correto e regular da camisinha feminina e/ou masculina é a medida mais importante de prevenção da sífilis.

Diagnóstico

O teste rápido (TR) de sífilis está disponível nos serviços de saúde do SUS, sendo prático e de fácil execução, com leitura do resultado em, no máximo, 30 minutos, sem a necessidade de estrutura laboratorial.

Tratamento

O tratamento de escolha é a penicilina benzatina (benzetacil), que poderá ser aplicada na unidade básica de saúde. Quando a sífilis é detectada na gestante, o tratamento deve ser iniciado o mais rápido possível.

Sífilis congênita

A sífilis congênita é uma doença transmitida para a criança durante a gestação (transmissão vertical). Por isso, é importante fazer o teste para detectar a sífilis durante o pré-natal.

MATÉRIA PUBLICADA NA EDIÇÃO 698 (27/11) DO FOLHA POPULAR