Encontro entre promotores e comunidade foi na terça-feira, 22 de março
Segundo o relatório, além de prejuízos socioeconômicos, a incidência de danos à saúde mental são alarmantes
A equipe do MP constatou ainda que, apesar dos danos sofridos, os entrevistados não estão satisfeitos com a forma como se deu o processo de reparação
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) realizou no dia 22 de março apresentação de relatório sobre as situações vivenciadas pelas pessoas que residiam ou trabalhavam na Zona de Autossalvamento (ZAS) e na Zona de Segurança Secundária (ZSS) da barragem Sul Superior, da mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais, atingidas pela elevação do nível de emergência da estrutura e consequente evacuação da área, em fevereiro e março de 2019.
O relatório, elaborado por equipe técnica do MPMG, é resultado de pesquisa quantitativa aplicada a 783 pessoas, que relataram prejuízos socioeconônicos, danos à saúde, falta de acesso à informação e de participação nas decisões e insatisfação com as indenizações e outras formas de reparação oferecidas pela mineradora Vale.
A pesquisa e o relatório foram realizados pela Coordenadoria Regional de Inclusão e Mobilização Sociais (Cimos) da Região Metropolitana de Belo Horizonte, a pedido da Promotoria de Justiça de Barão de Cocais, com objetivo de levantar dados para instrução do Inquérito Civil nº MPMG-0054.21.000181-1, instaurado para apurar violações ou ameaças a direitos humanos e fundamentais individuais e coletivos perpetradas pela mineradora às comunidades e pessoas afetadas pela evacuação/remoção forçadas decorrentes da elevação do nível de emergência da barragem.
De acordo com o coordenador do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Direitos Humanos (CAO-DH), promotor de Justiça Francisco Ângelo Silva Assis, o relatório apresenta indicadores de que revisões precisam ser feitas pela empresa, seja em relação a acordos já estabelecidos ou a futuros acordos. “O MP espera que a empresa se preocupe com toda a abrangência dos danos proporcionados, corrigindo as falhas identificadas. Ela ainda pode revisitar seus métodos e produzir uma reparação integral dos danos gerados, de modo a garantir a dignidade da pessoa humana, que é o principal objetivo da nossa Constituição, e a fazer cumprir seu discurso de transparência e engajamento social”.
Dados e conclusões apresentadas
Dos 783 entrevistados, 61,8% informaram que não houve evacuação ou remoção em seu núcleo familiar, ao passo que em 37,9% dos núcleos familiares ao menos uma pessoa foi evacuada ou removida em decorrência da elevação do nível de emergência, e 0,3% não responderam ou não souberam responder.
No entanto, mesmo aqueles que não foram removidos, também relataram danos à saúde e prejuízos socioeconômicos, com 92,8% do total dos respondentes apontando que sofreu pelo menos um dano categorizado no estudo. No universo de pessoas entrevistadas, 74,3%, afirmaram ter tido a saúde mental ou psicológica prejudicada, 71,1% disseram que houve queda na qualidade de vida e 70,1% relataram que foram obrigados a alterar seus hábitos ou costumes em decorrência da elevação do nível de segurança da barragem.
Segundo o relatório, os dados sobre a incidência de danos à saúde mental são alarmantes: em 96% dos núcleos familiares foi relatado pelo menos um sintoma relacionado à saúde mental, em 90,3% pelo menos três sintomas, 85,8% indicaram a presença de pelo menos cinco sintomas e 69,6% relataram pelos menos 10 sintomas.
A partir dos dados obtidos e das análises realizadas, a equipe do MPMG constatou ainda que, apesar dos danos sofridos, os entrevistados não estão satisfeitos com a forma como se deu o processo de reparação. Cento e vinte entrevistados afirmaram que a Vale negou totalmente as solicitações de indenização. Das 155 pessoas que fecharam acordo com a Vale, 81,5% afirmaram que a indenização não cobriu todos os danos sofridos pelo núcleo familiar e apenas 4% afirmaram estar satisfeitas.
O relatório conclui ainda que houve dificuldade no acesso à informação durante o processo, já que a maior parte das pessoas entrevistadas que fecharam acordo de indenização com a mineradora não possuía as informações necessárias para a tomada de decisão. As informações coletadas indicam também que houve unilateralidade, isto é, falta de espaço para que as pessoas atingidas pudessem apresentar contrapropostas e suas demandas, e que a empresa utilizou critérios diferentes de indenização para casos em que os danos sofridos eram semelhantes.
Em relação ao Plano de Compensação e Desenvolvimento para Barão de Cocais, elaborado pela Vale, a pesquisa aponta que a maioria das pessoas entrevistadas (54%) sequer tem conhecimento da existência do documento e apenas 8% sabem que ele existe e conhecem seu conteúdo. Entre os que alegaram algum grau de conhecimento sobre o documento, somente 11,9% declararam estar satisfeitos com as ações do Plano. Apenas 10,7% de todas as pessoas entrevistadas afirmaram ter conhecimento a respeito da realização da eleição para construção do Plano e apenas 4% do público-alvo afirmaram considerar que o processo de eleição para o Plano representou o conjunto das pessoas atingidas. Conforme o relatório, esses dados demonstram forte indício de falta de participação e problemas de representatividade no processo de elaboração do Plano.
Para acessar o relatório, clique aqui.
Com informações do MPMG