Moradores da área evacuada pedem que Justiça não acate pedido da Vale
Cerca de 50 pessoas, entre crianças, jovens e adultos, das comunidades de Socorro, Piteiras, Tabuleiro e Vila do Gongo, em Barão de Cocais, evacuados no dia 8 de fevereiro de 2019 devido ao risco de rompimento da barragem Sul Superior da Vale, na mina desativada de Gongo Soco, se mobilizaram na tarde de sexta-feira (18), próximo à área interditada e onde estão suas residências, para protestar e solicitar da Justiça que não acate o pedido da Vale, que quer cortar o renda-mínima, contrapartida que envolve o pagamento de aluguel, roupa, alimentação, luz, água, gás e TV a cabo para as famílias que ainda não venderam seus imóveis para a mineradora e permanecem em hotéis e pousadas.
Lidiane Mendes, membro do Movimento pela Soberania Popular da Mineração, uma das organizadoras do protesto do dia 18, disse que a Vale tirou o morador da terra devido a um problema gerado por ela, o alojando em hotéis e pousadas. “Hoje, a Vale diz que está pagando um benefício aos moradores evacuados que ainda não fecharam acordo de venda ou aluguel da área. Mas o que ela classifica como benefício, nós entendemos ser mais do que uma obrigação, o mínimo devido a todo o impacto gerado na vida destas pessoas, hoje em estado de refugiadas, que antes cultivam alimentos para consumo e venda em um ambiente avesso ao estresse de um centro urbano”, disse.
“Não é apenas vender, é pensar no futuro na cidade”, alerta o líder comunitário Nicolson Resende
O líder comunitário, evacuado da Vila do Gongo, Nicolson Pedro de Resende, disse que a Vale tenta forçar os moradores que ainda não aceitaram a proposta de compra. “Imagine você, que sempre morou na roça e sobreviveu por meio da agricultura, tendo que morar na cidade, pagando aluguel e cuidando da família sem ter uma profissão, sem emprego? Não é apenas vender, é pensar no futuro na cidade, que tem custo de vida alto e muda toda uma cultura.
O que a Vale quer é deixar o morador desesperado e com isso, comprar o restante dos imóveis, e está funcionando, pois tem famílias vendendo por um valor três vezes inferior ao valor real. Quem aceitar a proposta de compra do imóvel, receberá uma parte dos danos morais e seis meses do auxílio e se alugar para ela, receberá por 12 meses, sem o auxílio do Renda Mínima. Após aceitar, o diálogo passa a ser por meio da Justiça. Aí vamos ficar cinco, seis anos, como está em Mariana, esperando a Justiça decidir. Estamos fazendo este movimento para mostrar para a Justiça que somos contra esta proposta, primeiro porque a Vale mente ao dizer que fez tudo em favor das famílias evacuadas de forma espontânea, quando na verdade, tivemos que brigar por tudo. Em uma audiência remota com advogados da Vale, eles tiveram coragem de justificar que estavam tirando o Renda Mínima porque nós não estávamos querendo trabalhar, como se fosse fácil a vida na roça. Eles nos chamaram de vagabundos, isso é inaceitável. Parece até que nós, moradores, pedimos para que a Vale nos tirasse de nossas casas 1h da madrugada devido ao iminente risco de rompimento de sua barragem”, diz Nicolson Resende.
Mais impactos
Durante a manifestação, foram mostrados os impactos sociais gerados em boa parte dos 500 moradores, que tiveram que trocar a vida na roça pela vida na cidade de surpresa, fato que aumentou registros de alcoolismo, depressão e uso de drogas, situação que tende a piorar com o passar dos anos.
A deputada estadual Andréia de Jesus participou da manifestação na região do Socorro
A deputada estadual Andréia de Jesus (Psol), participou do movimento na área interditada. “Somos a favor da dignidade, respeito aos moradores evacuados, para isso defendemos o diálogo, que deve ser feito juntamente com o defensor público para ter validade”, disse. No encontro com a comunidade, a deputada anotou diversos pedidos dos moradores, que se resumem em apoio para que a Justiça não acate o pedido da Vale.
Apoio
O prefeito Décio Santos se solidariza com a questão dos moradores. “Em momento algum deixamos de apoiar e acompanhar a luta dos moradores evacuados. Somos solidários à causa e classificamos como absurda a proposta da Vale, em suspender o auxílio. O Município vai usar os meios legais para auxiliar os moradores em resposta a essa proposta desrespeitosa da mineradora”, diz.
Muro colossal
O muro de 36m de altura por 330m de extensão e 10m de largura, construído pela Vale a 6 quilômetros da barragem Sul Superior, na mina de Gongo Soco, em Barão de Cocais, foi concluído em fevereiro deste ano e aguarda auditoria técnica para o início da descaracterização da barragem Sul Superior, serviço que deve ocorrer por um período de 5 anos.
Esse muro tem o objetivo de reter 100% dos volumes das barragens Sul Superior e Sul Inferior caso ocorra a ruptura, evitando que os rejeitos alcancem a zona de segurança secundária (Zass) dos municípios de Barão de Cocais, Santa Bárbara e São Gonçalo do Rio Abaixo.
Após os serviços, o muro será demolido e a área degradada deverá ser recuperada e integrada à natureza e cerca de 50 famílias, que ainda não foram indenizadas ou não acertaram acordos, poderão voltar para suas casas nas comunidades evacuadas no dia 8 de fevereiro de 2019 (há 19 meses).