Por que as pessoas ainda caem no golpe das pirâmides financeiras

TENTAÇÃO DO DINHEIRO FÁCIL

Se lhe oferecerem por aí investimento com rentabilidade muito acima da média do mercado (10% ao mês, 2% ao dia….), prometendo retorno rápido e comissões se você trouxer novos investidores, cuidado! Pode ser golpe.

Uma pesquisa da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL) e do SPC Brasil, divulgada no início de dezembro, mostra que 11% dos brasileiros já perderam dinheiro em investimentos fraudulentos. Entre eles, mais da metade (55%) foram vítimas de pirâmide financeira, um tipo de trapaça muito antigo, com referências históricas lá na União Soviética, mas que continua pegando muitos investidores desavisados.

Como funciona
As características principais de uma pirâmide financeira são investimento fácil, promessa de retorno rápido e polpudo e necessidade de mais adeptos. Geralmente funciona assim: o investidor é convidado a fazer um aporte que pode ser de valor alto ou não. Uma vez dentro, ele é instigado a chamar novas pessoas com a mesma promessa de lucro fácil. O recurso “investido” pelos novos participantes garante a “rentabilidade” dos primeiros da pirâmide durante certo tempo.

Há também sempre o discurso autoconfiante do “líder”, o golpista-fundador. Então, quando não há mais gente para entrar com dinheiro novo, o esquema se desmorona, deixando no prejuízo a maior parte das vítimas.

O caso Firv
Em Itabira estima-se que mais de mil pessoas foram lesadas por um esquema de pirâmide em 2010 no caso da Firv Consultoria e Administração de Recursos Financeiros. Há registro inclusive de investidor que cometeu suicídio na época ao descobrir que todo o patrimônio havia se perdido. Outros entraram em depressão. Várias dessas pessoas venderam bens, como casas, carros e entregaram ao golpista o resultado de uma vida inteira de esforço.
Infelizmente, o caso não é o único. Só em 2019, operações da Polícia Federal e de órgãos reguladores do mercado financeiro desmascararam diversas pirâmides que operavam ancoradas, principalmente, nas criptomoedas. Vários golpistas foram presos.

Entre as vítimas, um itabirano que pediu anonimato perdeu dinheiro nessa nova onda de fraudes. Ele contou que em princípio ficou receoso, mas decidiu fazer aportes em uma empresa que se dizia mineradora de Bitcoin, a convite de um amigo de Brasília que estava tendo lucros exorbitantes com as operações – o extrato bancário registrava mais de R$ 900 mil.

“No meu caso, entrei com um capital e a agência ia me pagando os rendimentos de acordo com resultados da mineração que eles diziam que faziam. Nos seis primeiros meses no site da “empresa”, eu via que estava rendendo muito acima da média do mercado. Investi 440 dólares [cerca de R$ 1,8 mil] com a promessa de reaver esse capital em seis meses. Mas isso não ocorreu. Além de ter perdido o dinheiro, já que o site não funciona mais, não saquei nenhum rendimento. Eu investi na confiança de que esse amigo já estava investindo. Ele também tomou prejuízo”, disse.

Armadilha da ambição
Para o educador financeiro e gerente do Sicoob Credimepi, Tiago Lacerda, o principal sentimento que leva as pessoas a caírem em um golpe tão antigo é a ganância. A princípio, a pessoa pode até ficar com o pé atrás, mas aí aparece a “prova social”. “Alguém mais corajoso, um amigo seu, começa a te mostrar os ‘investimentos’ dele e a te instigar. Mostra o extrato da conta bancária, o que está rendendo, e aí você se anima”, afirma Tiago.


Conforme o educador financeiro, Tiago Lacerda, o principal sentimento que leva as pessoas a caírem em um golpe tão antigo é a ganância

É golpe! Como saber
De acordo com o educador financeiro, o primeiro passo é verificar se a empresa é registrada na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Lá tem a relação de todos as corretoras, bancos de investimentos, fundos e profissionais autorizados a atuar no mercado de capitais, como agentes autônomos, gestores e administradores de carteira.

Vale comparar também a rentabilidade oferecida pela empresa com a do mercado. Se a promessa for de rendimento fixo, a base é a taxa Selic/CDI, hoje em 4,5% ao ano. Percentuais que descolem muito dessa média podem ser suspeitos. Rendimentos altos são até possíveis, mas na renda variável e para isso é preciso correr risco. No mercado de Bolsa de Valores o investidor pode ganhar, mas também perder; não há garantias.

Criptomoedas
Tiago Lacerda afirma que pirâmides sempre existiram. Perguntado se as criptomoedas têm contribuído para a proliferação dos golpes, ele afirma que a questão não é a moeda virtual em si. “Já teve pirâmide do boi gordo, da avestruz, da comercialização de contêiner. A diferença não é a questão das criptos. Mas em dois pontos elas facilitam; primeiro, é digital e isso está acessível na internet. Segundo, é algo complexo que as pessoas não entendem e acabam delegando isso para alguém que se diz entendido”, explica.

A pesquisa da CNDL/SPC, citada no início da reportagem, perguntou aos entrevistados por que aceitaram o investimento. 44% disseram que se interessaram pelas promessas de rendimento alto; 36% responderam que é porque não precisariam entender de investimento; e 32% citaram as garantias de baixo risco.

Os educadores financeiros são unânimes em orientar a busca constante por informações quando o assunto é investimento. Ademais, se lhe oferecerem oportunidades de ganho fácil e rápido, parecendo muito bom para ser verdade, lembre-se daquele provérbio antigo: “Quando a esmola é demais, o santo desconfia”.

MATÉRIA EXCLUSIVA PUBLICADA DA NA EDIÇÃO 700 DO FOLHA POPULAR