FOTO: Maurício Martins, presidente da CDL Itabira
Após o terceiro dia de postas fechadas, bate o desespero no empresariado em Itabira
O decreto de calamidade pública que proíbe o funcionamento de lojas, e outros segmentos não essenciais, em vigor há três dias, começa a tirar o sono dos empresários.
Em conversa com o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Itabira, Maurício Henrique Martins, ele aponta que a situação já é de desespero.
“Acabei de conversar com colegas e a situação é muito preocupante. Sabemos que o coronavírus é real. Contudo, nenhum dos decretos é claro suficiente em relação as lojas de rua. Por outro lado, estamos vendo casas lotéricas e bancos funcionando normalmente para receber tributos e boletos das lojas que estão fechadas. Como pagar, se não estamos vendendo? É fácil defender o fechamento. Acredito que se a circulação de pessoas e o comércio não voltarem logo, vamos contabilizar enormes prejuízos e inevitáveis demissões. Impossível segurar até a Páscoa, dentro de 15 dias. Estamos em contato direto com o jurídico da Federaminas [Federação das Associações Comerciais e Empresariais de Minas Gerais], para saber o que fazer, legalmente, em favor do retorno das atividades”, disse Maurício Martins.
A contadora e advogada Cristina Oliveira, prefere ignorar a postura do presidente Jair Bolronado no dia 24, de que o povo brasileiro deve voltar a trabalha, e dar dica em relação ao Covid-19. Segundo ela, o ideal é ficar em casa, mas se for um serviço necessário, o mínimo que pode ser feito é oferecer condições de acesso do funcionário ao trabalho, evitando transporte coletivo. “O ideal é o funcionário usar o próprio carro ou ir para o trabalho de carona com um colega. No local de trabalho, além das condições de higiene, oferecer mascaras e álcool acima de 70 é essencial. Outra observação é em relação ao espaço para desenvolver as atividades, que deve ter distância mínima de dois metros de um funcionário a outro”, aconselha Cristina Oliveira, concluindo que agora é aguardar a evolução dos casos suspeitos em Itabira.
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Para reflexão
Coronavírus – As mortes invisíveis ou um chamado à sanidade da classe médica
O combate à pandemia matará mais do que o coronavírus. A diferença é que serão mortes invisíveis.
Os números ainda não estão consolidados, mas essa é uma tese cada vez mais plausível.
Antes de entrar no assunto da pandemia, me permitam fazer duas comparações que tornarão o entendimento do restante do artigo mais simples.
A CURA DO CÂNCER
Ao contrário do que as pessoas imaginam, não é muito difícil eliminar um câncer. Qualquer câncer. Para destruir todas as células do organismo, basta utilizar doses gigantescas de quimioterapia ou, caso isso não funcione, radioterapia também em altíssimas doses. Essa estratégia só não foi adotada ainda por conta de um pequeno empecilho: além da erradicação do câncer, ela resulta na morte do paciente.
Toda a estratégia de combate ao câncer deve, portanto, buscar um equilíbrio: deve ser agressiva o suficiente para eliminar o tumor, mas não ao ponto de matar o paciente.
Na teoria é fácil; na prática, nem tanto.
Nunca é possível prever com certeza qual será o comportamento de um câncer em um paciente específico. O médico precisa se embasar em estatísticas existente e na avaliação individual.
Em casos de cânceres mais agressivos, se tolera um risco maior. No caso de tumores menos agressivos, não se arrisca tanto.
O tratamento perfeito é aquele que ataca apenas o câncer, poupando o resto do organismo. Infelizmente, para a maioria dos casos, esse tipo de tratamento não existe.
ACIDENTES DE TRÂNSITO
Entre 2008 e 2016, o Brasil teve 368.821 vítimas fatais de acidentes de trânsito, o que resulta em uma média de 40.980/ano.
Somados a estes, temos cerca de 1,6 milhão de feridos, que incluem um grande número de inválidos.
Para piorar a situação, a maioria das vítimas são jovens.
Certamente ninguém negaria que esse é um problema extremamente grave, e que necessita ser combatido.
Esse problema também possui soluções simples:
– redução da velocidade máxima para 30Km/h em todo território nacional;
– proibição das motocicletas e bicicletas (pelo risco de queda mesmo em baixa velocidade);
– uso obrigatório de capacete e cinto de quatro pontos;
– fiscalização rigorosa e multas pesadas para os infratores;
Há de se concordar que essas medidas fariam com que as mortes por acidente de trânsito caíssem para números próximos de zero.
O único problema que se colocaria é o custo social e econômico da medida, que são tão óbvios que me desobrigo de descrever.
O PROBLEMA DO CORONAVÍRUS
O coronavírus não é um vírus especialmente mortal. Na verdade, a mortalidade em crianças e jovens imunocompetente é até menor do que a da gripe comum ou do H1N1.
O problema, repete-se sempre, seria sua disseminação rápida, o que levaria a um grande número de casos graves em um curto período de tempo, resultando no colapso do sistema de saúde, principalmente no que se refere aos leitos de terapia intensiva.
A POSSÍVEL SOLUÇÃO
A solução mais óbvia nesse caso seria aumentar em caráter emergencial a capacidade de absorção dos serviços de urgência e os leitos de terapia intensiva, como já foi feito em outras epidemias.
Outro ponto importante, seria acalmar a população, esclarecendo que a enorme maioria dos casos são leves, não havendo necessidade de uma corrida às unidades de urgência e emergência.
Por fim, poderia se enfatizar o isolamento, dentro do possível, dos indivíduos em risco.
A CATÁSTROFE
O problema é que começaram a surgir estudos projetando cenários apocalípticos, com a morte de 1% ou mais da população caso nada fosse feito. Nesses cenários, teríamos 2,5 milhões de mortes nos Estados Unidos e 2 milhões no Brasil.
O principal estudo foi elaborado pelo Imperial College e, apesar de sua metodologia já ter sido muito questionada por cientistas importantes, teve um impacto determinante no que se seguiu.
Não vou aqui esmiuçar os problemas do estudo, mas alguns dados da vida real sugerem que talvez o monstro não seja tão feio assim. Morreram até agora na Itália cerca de 5.000 pessoas. Digamos que chegue a 10.000 pessoas até o final da pandemia. Fazendo uma regra de três e desconsiderando as diferenças epidemiológicas e dos sistema de saúde, teríamos cerca de 50.000 mortes nos Estados Unidos e 40.000 no Brasil. É muito? Depende da interpretação, mas o fato é que estamos falando de escala de valores bem diferentes.
ACHATAR A CURVA
Uma vez estabelecidas as previsões apocalípticas, com estimativas de óbitos da ordem de milhões, a opção de simplesmente melhorar a capacidade de absorção do sistema de saúde sumiu do cenário.
A palavra de ordem, repetida mesmo por quem nunca estudou uma linha de epidemiologia, passou a ser “achatar a curva”.
Na teoria é bastante simples: reduzir a velocidade de propagação do vírus, permitindo que o sistema de saúde absorva aos poucos os casos graves.
ISOLAMENTO SOCIAL – É POSSÍVEL?
Dentre as possíveis estratégias, o governo brasileiro optou pela mais agressiva, a quarentena de toda a população com a consequente paralisia da economia.
A primeira questão que se coloca é a factibilidade desse isolamento.
Para uma família de classe média ou alta, não é tão difícil manter um isolamento estrito por meses. Só que o Brasil não é um enorme bairro de classe média. Nas favelas e periferias a situação (física mesmo) é muito mais difícil.
Outro ponto: milhões de brasileiros dependem para comer, não digo do dinheiro do mês, mas da semana! Como essas pessoas sobreviverão a dois meses de quarentena?
Mas digamos que todas as pessoas consigam realizar a quarentena de forma satisfatória e a epidemia tenha sido resolvida. Então, a pergunta que terá que ser feita é: valeu a pena?
ECONOMIA É VIDA
O brasileiro tem uma baixa capacidade abstrativa e uma péssima relação com dinheiro. Mistura explosiva.
Quando alguém tenta alertar sobre os impactos financeiros de combate à pandemia é rotulado como insensível (no mínimo).
Como assim você está mais preocupado com dinheiro do que com a vida das pessoas?
As pessoas confundem riqueza como papel pintado que a representa e acham que crise econômica é problema de quem investe na bolsa.
O fato nu e cru é que recessão econômica resulta em mortes ou alguém acha que o fato de países mais ricos terem maior expectativa de vida é mera coincidência?
Recessão econômica significa menos dinheiro para investir em saneamento básico (mais mortes), em policiamento (mais mortes), em atenção básica à saúde (mais mortes) e até em UTIs (mais mortes).
Recessão econômica e quebradeira de empresas também significa menos pessoas com plano de saúde e mais demanda para o SUS, cujo financiamento diminuirá (mais mortes).
E daí fica a pergunta:
Tentar evitar um possível colapso do sistema de saúde causando o colapso de toda a economia é racional?
AS MORTES INVISÍVEIS
Parte das mortes invisíveis serão decorrentes da crise econômica, mas existem outras das quais ainda não ouvi ninguém falar.
Boa parte do sistema de saúde está parado por conta da pandemia. Cirurgias eletivas e consultas não emergenciais foram suspensas, muitos exames não estão sendo realizados, diversos transplantes de medula e de órgãos sólidos foram suspensos. Além disso, enfermarias inteiras estão vazias e leitos de UTI estão reservados para o tratamento de pacientes com coronavírus. Isso sem falar nas doações de sangue e plaquetas, que caíram drasticamente em muitos hemocentros.
Tudo isso causará mortes:
– o paciente que está esperando um cateterismo pode infartar;
– a demora em consultar com um oncologista pode fazer com que o câncer se torne irressecável;
– o atraso no diagnóstico pode ser fatal para um paciente com leucemia aguda;
– os leitos reservados da UTI podem ser a diferença entre a vida e a morte para um paciente que precise de cuidados intensivos hoje;
– o atraso nos transplantes e o consequente aumento das filas com certeza absoluta ocasionarão mortes;
– a redução do estoque de hemocomponentes pode ter consequências trágicas para os serviços de emergência, pacientes cirúrgicos e hematológicos principalmente.
Poderia passar várias páginas dando mais exemplos, mas acho que a ideia já ficou clara.
SENSO DAS PROPORÇÕES
O senso das proporções, base de toda escolha racional, virou crime de lesa-pátria. Cotejar a mortalidade por gripe com os dados de mortes por coronavírus virou prova inconteste de obscurantismo.
Ora, sendo finitos os recursos disponíveis para investimento em saúde, é fundamental buscar conhecer a exata dimensão de cada problema para melhor alocar os recursos.
É preciso, sim, que a comunidade médica se detenha sobre os dados para ter a real dimensão do problema. Não é possível trabalhar apenas com números absolutos e muito menos se deixar contaminar pelo clima de pânico disseminado pela mídia e redes sociais.
A MORTE DE IDOSOS
Em uma sociedade impregnada pelo politicamente correto e formada por pessoas hipersensíveis, dizer o óbvio tornou-se muito perigoso. Por exemplo, a constatação de que uma epidemia que acometa mais pessoas muito idosas é menos grave do que uma que vitime predominantemente jovens tornou-se prova suprema de insensibilidade.
Na Itália, a expectativa de vida para homens é de cerca de 80 anos e para mulheres de 85 anos. Já a idade média dos óbitos por coronavírus foi respectivamente de 79 anos e 82 anos. Além disso, a enorme maioria dos idosos que morreram possuía diversas comorbidades. O que quer dizer isso na prática? Isso quer dizer que uma grande parte das vítima, caso não morresse em decorrência do coronavírus, morreria na próxima gripe, na próxima infecção urinária, na próxima pneumonia. Pode ser triste, mas é a realidade.
Aliás, pouca gente tem coragem de colocar isso no papel, mas um idoso de 75 anos com várias comorbidades terá muita dificuldade de conseguir um leito de UTI no SUS, mesmo fora de um período de pandemia. Os motivos para que isso ocorra são dois:
1. O SUS sempre está em crise e o número de leitos de UTI são cronicamente insuficientes. Nesse contexto, os pacientes jovens são priorizados.
2. Em muitos casos, ao levar um paciente muito idoso com várias comorbidades para a UTI, você não estará prolongando a vida dele, mas prolongando a sua morte. Isso possui até um nome: distanásia.
A IMPRENSA MORTAL
Uma vez instalado o pânico, é virtualmente impossível para um gestor público evitar a tomada de medidas extremas.
Mesmo Trump, o homem mais poderoso do mundo, depende do voto popular. Agora, pare e pense: que político resistiria a um bombardeio diuturno da mídia, o culpando por cada morte ocorrida durante uma pandemia.
A mesma lógica vale para governadores, prefeitos, diretores de hospitais, coordenadores de CCIH. Ninguém quer ser taxado como negligente.
Toda a divergência é suprimida. Qualquer um que questione a eficácia ou os custos do isolamento social é visto como um homicida de fato ou ao menos em potencial. Por outro lado, todas as ações com algum potencial de aumentar o distanciamento entre as pessoas passa a ser louvado.
Começa então uma disputa por parte dos agentes públicos para ver quem toma a medida mais extrema. Polícia nas ruas, helicópteros para esvaziar as praias, multas para quem for pego fora de casa. Mais um pouco e o uso de snipers para abater os recalcitrantes será cogitado.
A CLASSE MÉDICA – UM CHAMADO À REFLEXÃO
O que observo entre meus colegas é: muita disposição para ação, muita coragem e pouca reflexão.
Infelizmente o conhecimento epidemiológico da maioria é muito pequeno e quase todos abraçaram a tese do achatamento da curva a qualquer custo sem muito questionamento.
É preciso que um número suficiente de médicos se debruce sobre os estudos já realizados (principalmente os que projetaram cenários desastrosos) e sobre os dados clínicos e epidemiológicos da pandemia nos diversos países.
É preciso também que, junto com economista de estatísticos comecem a calcular o impacto de mortalidade da paralização da economia.
O JUÍZO FINAL
Uma hora a pandemia estará acabada e será feita a contagem dos mortos, cujo número ainda é incerto.
Entretanto, tenho certeza que as narrativas já estão prontas:
1. Se a taxa de mortalidade ficar abaixo das dos outros países, se dirá que o isolamento social foi um sucesso.
2. Se as taxas de mortalidade ficar acima dos outros países, se dirá que o isolamento social não foi feito como deveria.
Meu único apelo é: quando forem analisar os resultados, não contem só os que morreram pelo coronavírus.
LEMBREM-SE DAS MORTES INVISÍVEIS!